Fundação Vanzolini

A Evolução da Certificação HQETM: França e Brasil em destaque na História da Sustentabilidade

Postado em Certificação | 9 de maio de 2024 | 8min de leitura
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Uma reflexão mais profunda sobre a sustentabilidade começou na década de 1990. Dentre outros eventos, foi nessa época que John Elkington introduziu o conceito conhecido como “Triple Bottom Line” (ou “Tripé da Sustentabilidade”), cuja ideia principal foi a ênfase na importância de considerar não apenas os resultados financeiros, mas também os impactos sociais e ambientais das organizações.

Uma vez iniciada a materialização do conceito de sustentabilidade e gestão sustentável, começa-se a busca de como estabelecer, medir e assegurar essa qualidade a uma organização ou seus produtos.

Sendo o setor de construção civil um dos maiores causadores de impactos ao meio ambiente, não é surpresa ter sido logo incluído na discussão sobre sustentabilidade, já durante esse período. 

Em 1996, foi criada na França a Associação HQETM (HQETM: Haute Qualité Environnementale), com o objetivo de reunir as partes interessadas para criar uma linguagem comum de conceitos e critérios e fornecer a referência que foi, mais tarde, chamada de “processo HQETM”.

O “processo HQETM” foi definido em 14 categorias, que deveriam ser consideradas para o desenvolvimento sustentável numa construção.  Nesse momento, essas quatorze categorias do processo HQETM foram divididas em quatro famílias:

Eco-construção

  1. Edifício e seu entorno
  2. Materiais
  3. Canteiro de obras

Eco-Gestão

  1. Energia
  2. Água
  3. Resíduos
  4. Manutenção

Conforto

  1. Conforto higrotérmico
  2. Conforto acústico
  3. Conforto visual
  4. Conforto olfativo

Saúde

  1. Qualidade dos ambientes
  2. Qualidade do ar
  3. Qualidade da água

Já na década de 2000, a ideia de “sustentabilidade” continua a crescer conjuntamente a conceitos como o do ESG (Environmental, Social and Governance), que enfatiza a integração de critérios ambientais, sociais e de governança nos processos de tomada de decisão empresarial.

Nesse contexto, a Certificação HQETM já se alinhava perfeitamente, promovendo padrões rigorosos nessas três dimensões.

No ano de 2002, com participação ativa das partes interessadas, o conceito do “processo HQETM foi utilizado para a criação de um processo de certificação, com requisitos para edifícios em cada uma das 14 categorias, levando a criação da primeira versão do referencial “Qualidade Ambiental do Edifício” (QAE). 

Esse foi o início da certificação HQETM (Haute Qualité Environnementale), um exemplo paradigmático da evolução da sustentabilidade, traçando uma trajetória que reflete, além dos avanços na construção sustentável, o amadurecimento da consciência ambiental global.

Globalização da Certificação HQETM e o caso Brasileiro

No Brasil, a busca por soluções sustentáveis na construção civil cresceu consideravelmente nas últimas décadas, em sintonia com a conscientização global sobre a urgência das práticas ecologicamente e socialmente responsáveis.

No início dos anos 2000, a Fundação Vanzolini identificou essa necessidade e realizou um estudo de todas as certificações existentes voltadas aos edifícios sustentáveis. De tal pesquisa, conclui-se que a Certificação HQETM é a certificação mais adequada para o Brasil, sendo apontados como alguns de seus principais pontos fortes:

Auditorias de terceira parte presenciais nas etapas-chave do empreendimento (fases pré-projeto, projeto e execução)

Na época chamávamos as três fases de programa, projeto e realização. Essas auditorias realizadas em momentos cruciais no desenvolvimento do empreendimento auxiliam até hoje na gestão dos projetos. As auditorias de 3ª parte também trazem maior confiabilidade nos resultados e incentivam a melhoria contínua da atividade de incorporadoras e ou construtoras.

Requisitos de sistema de gestão

Apesar do foco da certificação ser o desempenho das edificações, avaliar o sistema de gestão permite que os empreendedores tenham um maior controle de seus processos.

Requisitos de desempenho

Desde as primeiras versões, a certificação HQETM leva em conta a variedade de soluções técnicas e arquitetônicas, que contribuem para o desempenho das edificações. Aqui vale ressaltar que, na época, os franceses foram pioneiros no desenvolvimento do próprio conceito de desempenho aplicado a edifícios, o qual é, hoje, no Brasil, tão largamente aplicado nas avaliações dessa mesma natureza, conforme NBR15575.

Respeito e interesse nas preocupações locais

Um dos objetivos da primeira versão AQUA-HQETM, de 2007, era realizar aplicações piloto da certificação HQETM fora da França e analisar a sua aderência.

Considerando esses e outros fatores, em 2007, a Fundação Vanzolini estabeleceu um contrato de cooperação com o Certivéa, organismo responsável pela certificação do “processo HQETM” para edifícios não residenciais na França.

Após um trabalho de quase um ano para criar um referencial de certificação adequado ao Brasil, a Fundação Vanzolini, em parceria com a Escola Politécnica da USP, publicou a primeira versão do “Processo AQUA” (Alta Qualidade Ambiental).

A partir de então, foram publicados vários referenciais de certificação AQUA. Dentre esses eventos, destaca-se o ano de 2010, quando a Fundação Vanzolini, em parceria com o Qualitel-Cerqual, lançou a primeira versão do Referencial de Certificação AQUA para edifícios residenciais.

Em 2013 foi lançado o “HQETM International”, a 2ª geração da certificação HQETM. Neste trabalho, foi considerado os anos de experiência na França, no Brasil e em outros países.

Na época, já havia mais de 300 edifícios certificados AQUA no Brasil, assim, foi possível caracterizar quais critérios eram globais – requisitos comuns independentemente de qual país a certificação será aplicada e quais os critérios locais – requisitos que os aspectos locais, tais como cultura, clima e normalização têm um impacto relevante.

Nesse momento, as 14 categorias se mantiveram, porém, foram reorganizadas em quatro temas:

EDIFÍCIOS RESIDENCIAISEDIFÍCIOS NÃO RESIDENCIAIS
ENERGIA E ECONOMIAS4. EnergiaENERGIA4. Energia
5. ÁguaMEIO AMBIENTE1. Edifício e seu entorno
7. Manutenção2. Materiais
MEIO AMBIENTE1. Edifício e seu entorno3. Canteiro de obras
2. Materiais5. Água
3. Canteiro de obras6. Resíduos
6. Resíduos7. Manutenção
SAÚDE E SEGURANÇA12. Qualidade dos ambientesSAÚDE12. Qualidade dos ambientes
13. Qualidade do ar13. Qualidade do ar
14. Qualidade da água14. Qualidade da água
CONFORTO8. Conforto higrotérmicoCONFORTO8. Conforto higrotérmico
9. Conforto acústico9. Conforto acústico
10. Conforto visual10. Conforto visual
11. Conforto olfativo11. Conforto olfativo

Além das atualizações dos Referenciais de Certificação para edifícios, outros esquemas de certificação foram lançados.

Planejamento Urbano foi lançado em 2010 na França e em 2011 no Brasil, nele foram estabelecidos 17 temas, em vez das 14 categorias. Em 2015, foi publicado o Referencial de Certificação para Infraestrutura Portuária, que contém 15 categorias, e, em 2019, a Fundação Vanzolini publicou a certificação AQUA-HQETM para Infraestruturas.

A Evolução da Certificação HQETM e AQUA-HQETM em sintonia com os ODS da ONU

Em 2015, a ONU (Organização das Nações Unidas) propôs aos seus países membros uma nova agenda de desenvolvimento sustentável para os próximos 15 anos, a Agenda 2030, composta pelos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).

Em linhas gerais, os ODS estabelecem metas globais ambiciosas, para abordar questões como saúde e bem-estar, cidades e comunidades inteligentes, água potável e saneamento, energia limpa, trabalho decente, indústria, inovação, consumo e produção responsáveis, ação contra a mudança climática, vida na água e vida terrestre, paz e parcerias.

É possível correlacionar temas da agenda global de forma bastante estreita com os critérios da Certificação AQUA-HQETM, demonstrando o seu alinhamento com os interesses internacionais e sua atualidade. 

Ao incorporar critérios específicos em conformidade com esses objetivos globais, a Certificação AQUA-HQETM tornou-se um instrumento prático para que edificações e empreendimentos contribuam de forma positiva para a consecução dos ODS.

Em harmonia com os ODS, a nova revisão do AQUA-HQETM 2024 foi estruturada com base em uma abordagem que traz inovação e uma visão global multicritério, em torno de 4 compromissos inseparáveis:

  • Qualidade de Vida;
  • Respeito ao Meio Ambiente;
  • Desempenho Econômico;
  • Gestão e Governança.

Isso significa que, a partir de 2024, todos os Referenciais de Certificação AQUA-HQETM terão os mesmos quatro compromissos como estrutura que se desdobram em categorias.

Como conclusão, a Certificação HQETM é uma demonstração da progressiva conscientização global sobre a necessidade de práticas sustentáveis na construção. França e Brasil, cada um à sua maneira, desempenham papéis significativos nessa trajetória, contribuindo para um futuro mais sustentável e equilibrado.

A história da Certificação AQUA-HQETM é, portanto, um capítulo fascinante na narrativa da busca por um mundo mais verde e sustentável, integrando-se de maneira notável com datas-chave na evolução da sustentabilidade global.

Caso seja de interesse, também recomendamos a leitura do nossos E-books:

Por Felipe Queiroz Coelho, responsável técnico pela certificação AQUA-HQETM e auditor líder na certificação AQUA-HQETM.

Revisado por Bianca Bonachela de Oliveira.

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